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Foto do escritorMariana Kneipp

Precisamos ter escolhas: autonomia financeira no combate à violência doméstica


Quando olharmos para 2020 no futuro, muitos se lembrarão das perdas de pessoas queridas, da luta diária pela sanidade mental em um longo período de isolamento social, da crise econômica. Todos elementos muito evidentes no cenário social e midiático desse ano. No entanto, 2020 também poderá ser classificado como o momento onde o avanço da equidade de gênero enfrentou o maior desafio do século XXI. Especialistas apontam que retrocedemos 30 anos da participação feminina no mercado de trabalho em um cenário que já era desigual.


É a primeira vez nos últimos três anos que a maioria das mulheres está fora da força de trabalho (que são os que estão trabalhando ou procurando emprego), de acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Esses dados já seriam alarmantes separadamente, porém, quando ampliamos o olhar e trazemos a lente da violência doméstica para o contexto, vemos que estamos diante de uma tragédia social.


Segundo estudo do Monitor da Violência, parceria do G1 com o Núcleo de Estudos da Violência da USP e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, nos primeiros seis meses de 2020, 1.890 mulheres foram assassinadas no Brasil, um aumento de 2% em relação ao mesmo período de 2019. O número de feminicídios, quando as mulheres são mortas pelo simples fato de serem mulheres, também teve uma leve alta. Houve 631 crimes de ódio motivados pela condição de gênero.


Já os casos de lesão corporal no contexto de violência doméstica caíram 11%. Incoerente? Não. Retrato da impotência.


A questão é que as mortes, na grande maioria das vezes, não podem ser escondidas. Já agressões, sim.


O número da violência doméstica não-letal não caiu. A cada dois minutos, uma mulher é agredida no país. Porém, com o isolamento social, a vítima não consegue pedir ajuda, devido à proximidade constante do agressor. Por isso, as denúncias despencaram.


Mais do que o medo de sofrer nova lesão - que pode ser fatal -, a vítima também tem muitos outros fatores que a levam a não denunciar, de acordo com a pesquisa "Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher", realizada pelo Senado Federal em 2017. Veja o quadro abaixo:


O terceiro fator da lista leva ao fechamento do ciclo do porquê esse é o período de maior desafio para a mulher nas últimas décadas. Para 29% das entrevistadas, a dependência financeira do agressor é um motivo para que ela não reaja. E engana-se quem pensa que somente vítimas de baixa renda são impactadas por isso. Repare na segmentação de renda do quadro acima. O percentual mais elevado é o de mulheres que ganham acima de dois salários mínimos.


Quando somamos a saída das mulheres do mercado de trabalho - muitas vezes, por funções de cuidado, seja com filhos, seja com demais parentes -, ao crescente aumento da violência doméstica com o silenciamento das vítimas por dependência financeira, vemos que o empoderamento feminino para buscar alternativas de autonomia se faz mais do que necessário. É imperativo. É urgente. É vital.


O que pode ajudar


Alguns projetos sociais têm feito um papel importante nessa agenda. O "Tua Vez", projeto do Instituto Maria da Penha, em Pernambuco, atende mulheres que têm medidas protetivas, reconhecidas como mais vulneráveis. Elas são encaminhadas pela Delegacia da Mulher e passam por uma triagem para se matricular em cursos profissionalizantes. Além das aulas, as mulheres recebem assistência social, apoio psicológico e jurídico.


Em São Paulo, o Programa Tem Saída, parceria entre a Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Trabalho da Prefeitura de São Paulo, Ministério Público, Defensoria Pública, Tribunal de Justiça, OAB-SP e ONU Mulheres, é uma política pública voltada à autonomia financeira e empregabilidade da mulher em situação de violência doméstica e familiar, que conta com o apoio de empresas privadas, que viabilizam vagas de emprego para as mulheres atendidas pelo programa.


Para quem quer iniciar o próprio negócio, a Rede Mulher Empreendedora também é uma excelente referência. Em parceria com o Google, a iniciativa criou o programa "Ela Pode", que oferece gratuitamente capacitações para mulheres em situação de vulnerabilidade socioeconômica, abordando temas importantes para os desafios mais comuns na área do empreendedorismo e empregabilidade, tais como: comunicação, liderança, negociação, finanças, networking, marca pessoal e ferramentas digitais.


Uma vez com renda própria, a educação financeira completa o ciclo de libertação. Nathalia Rodrigues, ou melhor, Nath Finanças ensina a como lidar com orçamentos apertados, com dicas valiosas e linguagem bem informal no YouTube. Focado no público de baixa renda, o canal da carioca de 21 anos, estudante de Administração de Empresas, dá exemplos práticos de como organizar a vida financeira de forma lúdica e fácil de aprender.


Seja através de iniciativas de projetos sociais, seja através de influenciadores digitais, o apoio para a independência financeira precisa chegar a mais mulheres. Isso vai acabar com a violência doméstica? Claro que não. Mas vai dar opções. E, em um momento onde a falta de alternativas é evidente, ter escolhas é o maior poder que podemos ter.


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