top of page
Buscar
Foto do escritorMariana Kneipp

Reflexos da Cultura do Estupro


Texto escrito por Bruna Angrisani, engenheira, pole dancer e plural




O fatídico "Eu jamais iria estuprar você porque você não merece", do homem que atualmente ocupa o cargo mais importante do país, teve mais um triste desenrolar em setembro de 2020… "Ah, mas existe relação entre a política e o capítulo vergonhoso do “Estupro Culposo” de Mari Ferrer?" Sempre - afinal, o que mais é essa fala vinda de uma figura pública e política com poder, senão uma forma de legitimar qualquer ato de um homem subsequente de suas conclusões sobre a aparência de uma mulher?


A culpabilização de uma vítima de estupro pautada em atributos físicos, como sua roupa, comportamentais, como seu nível alcoólico, ou quaisquer outras desculpas, são argumentos utilizados pelos homens para justificar o cultivo da cultura do estupro desde a origem da sociedade. Não foi só o advogado Cláudio Gastão da Rosa Filho, ao humilhar Mariana Ferrer, quem replicou a cultura do estupro. Nem foi apenas o promotor Thiago Carriço, ao praticamente abrir um precedente jurídico capaz de destruir a vida das mulheres, que plantou mais uma semente do machismo.


Toda vez que "moral" e "princípios" sobrepõem o respeito a uma mulher, a cultura do estupro está sendo reafirmada.

Nós somos criadas para replicar a cultura do estupro e, assim, ajudar na sua perpetuação, contestando a índole de uma vítima e, por consequência, o seu relato, baseando tais dúvidas em pré-julgamentos sobre ela. E, ao sermos criadas dessa forma, a sociedade também cria em nós o medo de um dia sermos essa vítima.


Quando você troca uma roupa para algo mais comprido porque você não quer dar brechas ao assédio no ônibus, você está com medo da cultura do estupro. Quando você tem receio de não beber mais um ou dois copos em uma festa, para assim não ficar vulnerável, pois você voltará sozinha, esse receio é causado pela cultura do estupro. E, dessa forma, a primeira reação das vítimas de estupro segue sendo culpar a si mesmas, pensando em como ELAS poderiam ter evitado aquela situação, e, em seguida, ter medo de pedir ajuda ou denunciar, já que elas sabem que serão desmerecidas e culpabilizadas.

No entanto, apesar de não gostar de dizer o óbvio, preciso repetir que estupro "sem intenção" de estuprar NUNCA vai existir. Escolher uma saia mais comprida não nos salvará de um estupro. Trocar o batom vermelho por um gloss sem cor não garantirá que nunca seremos assediadas. Postar apenas fotos sérias e com muitas roupas não fará com que os 180 casos de estupro diários no Brasil caiam para 0.


Estupros não precisam de contexto. Se aquela relação aconteceu sem consentimento, ela, necessariamente, foi um estupro, e a culpa é do estuprador, SEMPRE!

E como vamos evitar estupros em um momento com lideranças que os revalidam e os descaracterizam como crime? Nos unindo e protestando, seja nas ruas, como as mulheres foram em 1976 quando o assassino e namorado de Ângela Diniz, alegando "legítima defesa da honra", teve um abrandamento de sua pena - fato só revertido após manifestação popular; seja nas redes sociais, sendo o tal "Movimentos Feminista infeliz" que incomoda muitos outros André de Camargos e Robinhos ou que pressiona o poder público até ele sair da inércia (ou do próprio poder).


Para cada soco no estômago que a Justiça nos der para tirar nosso ar, como perdemos hoje junto de Mari Ferrer, que sejamos ainda mais ativas e contestadoras em nossos ciclos. Que cada vez que tentem nos enfraquecer e impor a nós a cultura do estupro, dizendo que nossos atos ou aparência podem nos fazer merecer um estupro, respondamos juntas, nos apoiando, conectadas de tal maneira capaz não só de incomodar a classe dominante homem branco e hétero, mas de encorajar cada dia uma mulher a mais a denunciar seu agressor. É pela nossa força juntas que conquistamos direitos, e essa é a força que tirará dos homens essa arma de poder cultural que eles usam para nos subjugar e controlar.


Infelizmente, para cada 1 Mari Ferrer que denuncia, há 10 que, hoje, desconhecemos. Que nossas lágrimas de decepção ou raiva hoje por todas essas mulheres possam regar nossas sementes no poder amanhã: mais mulheres na Justiça, mais mulheres em cargos de liderança e, principalmente, mais mulheres na política.



37 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

Comments


bottom of page