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Foto do escritorMariana Kneipp

Um depoimento sobre vulnerabilidade

Texto escrito por Priscila Laysson

Nunca fui uma mulher que colocou a maternidade como papel principal na vida, mas a visualização de um filho(a) sempre esteve nos meus planos.


Era um plano que por muito tempo ficou sem data específica (aliás, o cronograma foi postergado diversas vezes), pois, afinal, me considerava jovem, com muitos sonhos e conquistas por vir e não conseguia ver uma criança encaixada dentro desse contexto.


Acontece que a natureza e a sociedade nem sempre acompanham sua idade mental (rs), então, quando me vi cercada por amigas onde a maioria já tinha filhos, por um casamento de anos e um marido mais velho que tinha um desejo muito forte de ser pai, e minha idade chegando no limite do 100% saudável para medicina, comecei a ponderar se a tal hora não estava chegando.


A "tal hora", de forma racional, passou por todos esses pontos:


· Casamento – Checked


· Marido empolgado com paternidade – Checked


· Amigas com filho para fazer programas de criança – Checked


· Idade e saúde – Checked


Mas aquela vontade visceral, que muitas falam, o tal relógio biológico, não tinha sido despertado. Mesmo assim, consenti em começar a tentar para valer, afinal minha lista estava completa... só faltava a vontade genuína, apenas isso. Tive medo dessa vontade nunca chegar ou que chegasse numa época em que a lista acima não fosse simples ou mudasse o cenário.


O consentimento veio embalado por uma falsa expectativa de que iríamos começar a tentar, que não deveria ser de primeira, afinal, um casal fértil só tem 20% de chances de engravidar dentro do mês e, por isso, de 6 meses a 1 ano é um período considerado normal para os tentantes.


Não veio de 1ª, mas veio de 2ª, e essa notícia veio com o misto de "eu consegui" (sou capaz de engravidar) e fudeu ao mesmo tempo.. já que agora era real, não tinha como voltar atrás.


Se fosse só essa ansiedade considerada normal para as gestantes, principalmente de primeira viagem, acho que teria contornado de boa, pois sou PhD em autoconhecimento (uma pessoa bem analisada rs), mas a gravidez veio como uma bomba de hormônios que devastaram meu físico e, consequentemente, abalaram o psicológico.


Fui diagnosticada com hiperêmese gravídica, uma condição que afeta cerca de 2% das gestantes. Um quadro mais extremo e grave do que os enjôos matinais. Passei o 1º trimestre inteiro sem me alimentar direito, entre idas e vindas de soro e medicação venosa, perdi 7kgs, tive que me afastar do trabalho e conviver com náuseas/vômitos constantes. Inferno não descreve os momentos que passei. E claro que isso abalou muito meu emocional.


Não era para ser tudo mágico? Por que logo eu seria contemplada nesses 2%? Ninguém me falou dessa possibilidade, se não teria colocado como risco na minha matriz SWOT (rs). Cheguei literalmente ao fundo do poço no auge dos meus 34 anos, não conseguia enxergar luz no fim do túnel. Imaginem passar mal 24h/dia.

Durante 20 semanas, essa foi minha realidade. Não conseguia me sentir grávida. Eu me sentia apenas doente. Não conseguia ter nenhuma conexão com o bebê, afinal ele era um parasita roubando minhas forças, e a identidade que construí ao longo da minha história, de uma pessoa comunicativa, alegre, de relacionamento fácil, trabalhadora e por aí vai (não tenho só virtudes mas é só para ilustrar rs)... me vi sofrendo e sozinha, pois mesmo com marido, família, amigos e remédios nada/ninguém podia aliviar minha sensação, só o tempo, e era difícil acreditar que logo eu, aquela pessoa que tinha plano A, B, C e D, estava a mercê do tempo.


Tive que aprender na marra a perceber que não controlo tudo, que por mais que tenha criado uma casca forte, sou vulnerável. Aprender que preciso viver um dia de cada vez, preciso respeitar meu tempo, entender meu corpo, estar mais conectada com meus sentimentos e parar de viver no automático ou nas fugas que usamos para a vida ser mais leve e tolerável.

Hoje, no auge das minhas quase 24 semanas de gestação, as coisas estão começando a se encaixar de novo, os enjôos diminuíram, voltei a me exercitar, trabalhar, só falta encaixar a comida na vida novamente.


Estou voltando a perceber a mulher que eu era antes desse turbilhão, voltando para minha “zona de conforto” e me reconectando comigo mesma.


O normal nunca será o mesmo, afinal tem uma outra pessoa se desenvolvendo dentro de mim e, depois que sair, demandará atenção, cuidados, etc... ainda não consegui me conectar inteiramente com a situação. Tem menos de três semanas que a rotina começou a retomar e já entendi da pior forma que não sou capaz de controlar tudo.


Hoje, me permito viver minha vulnerabilidade. Não preciso ser forte o tempo todo e tudo bem!


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